“Eu sei que a morte eu não mato. Mas deixo toda lanhada”.
(Vitor Ramil em Causo Farrapo)
As palavras perda-pesar-luto formam uma tríade que, rapidamente, aproxima de outro assunto que gera desconfortos e estranhamentos quando entra em pauta, a morte, seja ela real ou simbólica. Elimina-se o assunto. Não se fala em luto ou em sofrimento, e, sobre ‘ela’ também não se fala, pode atrair, dizem alguns. Só há silêncios reveladores. Ou, se fala tanto que o discurso estatístico, como ocorreu durante a pandemia ocorrida pelo Covid-19, anestesia qualquer pensamento sobre ‘ela’.
Perda, explicam os dicionários, é substantivo feminino, é quando perdemos, quando deixamos de possuir ou ter algo. Quando perdemos algo ou alguém que é importante e significativo, sofremos por essa perda e somos tomados pelo sentimento de pesar.
O pesar-substantivo é definido como sentimento de tristeza por uma perda, comiseração, pena, sensação de mágoa ou de remorso. Mas existe também pesar-verbo: pesar algo, ver o peso de algo ou alguém. O pesar-substantivo e o pesar-verbo seguem um ao outro nos léxicos e na vida. Quando experimentamos uma perda significativa, não fica tudo pesado? O corpo pesado, a cabeça pesada, a vida fica pesada. Parece até que se carrega um peso maior que o próprio corpo. Mas também, podemos pensar que o ‘pesar’ só é sentido quando perdemos algo ou alguém que tem um peso grande para nós, que ocupava um lugar importante e um espaço grande em nossa história de vida.
A última parte da tríade é o luto, que é definido como um sentimento de pesar, consternação, tristeza profunda ou dor pela morte de alguém, há sinais exteriores de tal sentimento, como os trajes. Na obra Relíquias de Casa Velha, por exemplo, Machado de Assis, escreve: “Minha mãe chorava, cosendo o luto, entre duas visitas de pêsames''. A roupa de luto foi, por muito tempo, a demonstração pública do sentimento de pesar. A ideia de coser o luto, costurar os pedaços da vida que ficaram, remendar a vida entre uma visita e outra, remete também a necessidade de uma rede de apoio para se viver esse tempo de costuras e refazimentos de vida.
O sofrimento nunca estará nas expectativas de virada de ano. Mas, uma vez que somos arremessados para dentro dessa estranha tríade, o que fazer? Como reagir? Como sobreviver? Sucumbir é uma opção?
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