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  • Foto do escritorVera Weissheimer

Etapas e fases do luto da criança

(Vera Weissheimer)


Eu gosto de conversar com crianças, elas são filósofas e nos ensinam muitas coisas.

Minha sobrinha, Ana Clara, de sete anos, contou:


“Eu não vivi muito ainda, mas já perdi muita gente.”


Quem você perdeu?

“O meu tio e um amigo do meu pai e da minha mãe, mas tem gente que morreu antes de eu nascer e eu sinto falta também”.


Você sente falta de quem?

“Sinto muuuuita falta da minha vó que era tua mãe e mãe da minha mãe. Era não, né. Ela é tua mãe e é a minha vó. Ela não me conheceu. E sinto falta dela. Também sinto falta da mãe do meu pai, que é também a minha avó."


E como é essa falta?

“É uma saudade que dói aqui quando penso nisso, mas logo passa”, disse ela passando as duas mãozinhas no peito. “Doeu mais, logo depois que nosso amigo morreu, com o meu tio eu era muito pequena, doeu menos. Mas é uma dor que foi se apagando, quando ela volta, ela vem fraquinha.”

A criança vivencia também as perdas familiares narradas em família. Então, é preciso tomar cuidado com o que e como falamos das pessoas que já não estão mais fisicamente no círculo familiar. Construir uma memória boa, ajuda a criança a fazer a sua elaboração de forma menos traumática.


Wilma Torres (1999) identifica três fases ou etapas principais mais comuns da vivência do luto pela criança. O protesto é, apontado pela autora, como a fase em que é difícil para a criança acreditar que a pessoa esteja morta, começa uma luta para recuperá-la, buscando qualquer imagem ou som que possa lembrar ou personificar a pessoa ausente. Uma menina de 9 anos, passou a dormir com as poucas jóias que a mãe possuía, tudo precisava ficar sob o travesseiro.


Depois de protestar e buscar a pessoa amada, a criança, afirma Torres, passa a experimentar a fase do desespero e da desorganização da personalidade, é quando começa a dar-se conta que a morte é um fato; o desejo por seu retorno parece não diminuir, mas a esperança da volta já não tem tanta força. A criança já não chora mais tanto, não grita mais, assumindo uma apatia, retrai-se de tudo, já não quer participar de brincadeiras. A terceira etapa é a da esperança, Torres a apresenta como o tempo em que a criança toma iniciativas para buscar novas relações e aceita entrar nas brincadeiras e atividades que lhe trazem alegria.


A autora Lucélia Elizabeth Paiva (2011) chama a atenção para o que chamou de sobreinvestimento e desinvestimento. O primeiro tempo seria uma fase de idealização do ente querido seguindo-se a fase de desinvestimento de energias e afetos na pessoa falecida. Esta segunda fase permitiria, conforme explica Paiva, a construção de novas relações, a introjeção da pessoa perdida sob a forma de memória, palavras, manias, modos de ser comuns ao morto e a si mesmo. Redirecionar o investimento de afeto e energia exige que a criança aceite, que a ausência da pessoa que morreu será permanente.


Para a psicanalista Ginette Raimbault (1999), a transição entre o tempo de sobreinvestimento para o desinvestimento, pode se estender por um tempo relativamente longo, até a criança conseguir fazer um investimento afetivo em um novo objeto, aceitar uma nova figura de afeto.


A morte é um enorme desafio para a criança. Como compreender o não-existir? Se para a pessoa adulta é difícil assimilar que alguém deixe de existir, como não seria para a criança? A infância não é um mundo sem sofrimentos, ao contrário, há monstros e gigantes que é preciso combater, e isso não é tarefa fácil. A morte com sua face mais conhecida como a da caveira andante é uma figura aterradora.

PAIVA, Lucélia Elizabeth. A arte de falar da morte para crianças. Aparecida, SP: Ideias & Letras. 2011.

TORRES, Wilma da Costa. A criança diante da morte: desafios. São Paulo: Casa do Psicólogo. 1999.

RAIMBAULT, G. A criança e a morte – crianças doentes falam da morte – problema da clínica do luto. [Trad. R.C. Lacerda]. Rio de janeiro: Francisco Alves, 1979.

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