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O que faz você feliz?

“Felicidade é só questão de ser

Quando chover, deixar molhar

Pra receber o Sol quando voltar”.

(Felicidade, Elba Ramalho)


Elba Ramalho canta que felicidade é uma questão só de ser. Para quem acredita que será feliz em algum momento futuro, tenho que dizer: não será. Porque a felicidade, seja ela em qual grau for, é agora e nunca depois.


Não estou supervalorizando o presente – mas, se não for possível captar a felicidade de estar vivo no momento, então, quando chegar o futuro, você esperará por outro futuro e, de novo, por outro futuro.


A cultura da imagem vai nos bombardeando com ofertas de harmonizações faciais, sorrisos e vidas possíveis. A busca incessante de beleza, juventude e felicidade é um deserto sofrido, não tem fim. Precisa-se sempre de mais uma dose até desfigurar-se o eu.


Há cicatrizes que não temos como eliminar ou esconder. Elas podem até ser maquiadas, mas não apagadas. Estão na alma. Nós somos também nossas cicatrizes. Quanto mais tentamos dissimular, mais elas se tornam evidentes.


Há uma cicatriz em cada um de nós, a primeira de todas: nosso umbigo. Com ele somos lembrados e lembradas de nossa ligação primordial com nossas mães, com a vida no útero, com a vida antes daqui. O dizer popular “olhar para o próprio umbigo”, mais do que uma definição individualista, é um chamamento para um olhar que se volte mais para si mesmo, para o centro, do que para os lados e os outros. É também uma necessidade de olhar e reconhecer as próprias feridas que marcam nossa biografia: isso faz parte de mim – e agora? O que faço com isso? É um olhar para o que fomos, para o que somos e para o vir a ser.


Tornar-se quem somos e quem podemos ser; tornar-se si próprio é um constante diferenciar-se dos cordões umbilicais que nos marcam e também amarram.


Não sei quando começa essa doutrinação para a felicidade necessária. Para as mulheres, talvez se inicie com as histórias de “e viveram felizes para sempre”. Até mesmo a Constituição dos Estados Unidos fala em “vida, liberdade e a busca da felicidade.”


A verdade é que não dominamos nossa vida. William Hazlitt, citado pelo analista junguiano James Hollis, em Pantanais da Alma, escreve que o ser humano “é o único animal que ri e chora: pois ele é o único animal que é atingido pela diferença entre o que as coisas são e o que elas deveriam ser”. Sofrer, reagir ou lamentar: o que escolher diante de uma situação de sofrimento?


Para a psicologia analítica há outra perspectiva: a meta não é a felicidade em si e por si só: é o significado. A vida há que fazer sentido.


Não há felicidade sem turbulência. Falo das turbulências que vêm naturalmente com a vida e dos momentos de dor que nos fazem perder a arrogância diante da própria existência. Para Hollis “são os pantanais da alma, as savanas do sofrimento, que fornecem o contexto para a estimulação e a obtenção do significado”.


Se a vida tem sentido, também o sofrimento tem? Será? O sofrimento em si não tem sentido: é dor, é desestabilizador, é destruidor. O sentido pode ser encontrado enquanto lutamos para passar pelo vale de sombras da morte. Como escreve Hollis, sofrimento acaba sendo o contexto, o terreno, mas nós o regamos e semeamos como soubermos fazer.


Para ser feliz é preciso saber que um momento pode conter a essência de uma vida inteira. Ficamos preocupados demais com o futuro – ou revivendo o que passou – enquanto perdemos oportunidades de amar, de viver e de saborear o que a vida nos traz. Afinal, o futuro se dá como possibilidade já agora.

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