No filme Sob o sol da Toscana, de 2003, há uma cena encantadora. Enquanto acende o fogo na lareira, um gentil corretor de imóveis narra uma história para tentar animar a personagem Frances: “Senhora, entre a Áustria e a Itália há uma parte nos Alpes chamada Semmering. É uma região de montanhas íngremes e altas. Lá assentaram os trilhos para ligar Viena e Veneza, antes mesmo que houvesse trem para percorrer o trajeto. Construíram porque acreditavam que um dia o trem chegaria até lá”. Temos boas razões para não nos ocupar com as impossibilidades; contudo, sempre haverá quem faça enquanto outros dizem ser impossível.
Essa passagem do filme me traz à mente um mito indiano contado por Rosiska Darcy de Oliveira, em Elogio da diferença – o feminino emergente: “Um faquir, depois de preparar cuidadosamente um laço na ponta de uma corda, joga-a para o alto e, seguro de que o laço se prendera em algum lugar além-nuvens, tranquilamente sobe por ela. E, diante do pasmo dos incréus, desaparece nas alturas, seguro na corda que prendera, quem sabe, em sua esperança”. Afinal, a esperança, escreve Rosiska, é assim: “Parece ilusória, mas essa ilusão vai impregnando a realidade e constituindo-a, a força atuante dentro dela”.
O que nos faz prosseguir contra toda a desesperança senão a força teimosa de acreditar que vale a pena ter fé na vida? Há quem abomine as utopias, que são os sonhos ainda sem-lugar (u-topos: sem-lugar). Acreditar que haverá um lugar para o que estamos sonhando chega a ser revolucionário, porque esperançar é juntar a utopia com um lugar, criando a força que concretiza possibilidades.
Em O Princípio Esperança, o sociólogo Ernst Bloch escreve que a esperança é um “ato contra a angústia diante da vida e as maquinações do medo”. A esperança é um princípio ativo de vida, não é espera ativa e nos pede participação o tempo todo. “A esperança que se adia faz adoecer o coração”, avisa o livro de Provérbios (13.12), e a esperança que se concretiza é árvore de vida. Ela amplia, e a desesperança reduz – e reduz tanto que parece não haver espaço nem mesmo para uma pessoa amiga se achegar e dizer que há um caminho possível. A desesperança faz crescer escamas nos olhos, ocupa todos os espaços, a esperança cura o olhar.
Se está difícil, busque ajuda, tente mais uma vez e mais uma. Tente quantas for preciso, a vida é um ato de fé.
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